Graciele Meira, profissional do Serviço Social, esteve na missão emergencial para atuar em resposta à crise humanitária dos Yanomami em Roraima
Neste dia 19 de abril, em celebração ao Dia dos Povos Indígenas, o Sindes traz uma entrevista com Graciele Meira, assistente social, servidora do Governo do Estado de Mato Grosso lotada na Secretaria de Trabalho e Assistência Social (Setasc), e Diretora de Mulheres do Sindes, que esteve como voluntária na missão humanitária em socorro ao povo Yanomami, em Roraima.
Graciele fez parte da Missão Yanomami, que é uma ação interministerial, coordenada pelo Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública do Ministério da Saúde. A ação foi montada quando a nova gestão do governo federal tomou posse e foi notificada sobre a morte de 570 crianças, que foram causadas por doenças evitáveis.
Muitas pessoas estavam desnutridas, especialmente idosos, e sem atendimento médico ou assistência social nos últimos anos. Além disso o garimpo ilegal desmatou a floresta, poluiu os rios e levou centenas de trabalhadores para a vizinhança das aldeias. A situação é bem mais grave do que a entrevista vai descrever, porque será focada nas providências.
Sindes – Como foi o chamado para a missão, de onde veio?
Graciele – A convocação veio da Força Nacional do SUS, que é [órgão] do Ministério da Saúde. Quando verificaram a situação de emergência eu fiz o cadastro de voluntariado no site do ministério para atuar em missões de situações de desastre ou emergência. Então recebi o contato da Força Nacional perguntando se eu tinha interesse em participar, respondi que sim, então fizeram a solicitação à Setasc. A secretária perguntou para minha chefe imediata se eu poderia ser liberada e a superintendente respondeu que sim, que a participação seria benéfica já que traria experiência para o trabalho com indígenas realizado pela Setasc. Os perfis convocados para essa etapa da missão eram de enfermeiros, técnicos de enfermagem, médicos, nutricionistas, farmacêuticos e assistentes sociais. De Mato Grosso eu fui a única.
Sindes – Qual foi o tempo dedicado à missão? Houve uma preparação para o contexto?
Graciele – A convocação foi do dia 16 de março a 4 de abril. Tivemos uma recepção da coordenação e uma explanação de um antropólogo para conhecermos algumas características culturais dos Yanomami. Poucos falam português, por isso a língua é uma das dificuldades. Recebemos um glossário com palavras básicas, mas na prática a comunicação é muito com gestos e o olhar.
Sindes – Sendo uma emergência, foi rápido o tempo da convocação até chegar no local do trabalho?
Graciele – Tudo foi muito rápido, da convocação para a missão até a infraestrutura disponibilizada. Nossa equipe não entrou no território Indígena Yanomami, fomos para a Casa de Saúde Indígena (Casai) em Boa Vista, onde recebe todos os povos do estado. Lá tivemos contato com várias etnias que vem para a cidade com casos mais graves de saúde. Uma característica do atendimento à saúde indígena é que o paciente não vai sozinho. Quando sai da aldeia, vai com a família e é preciso dar suporte a esses também.
Sindes – A hospedagem e a alimentação foram cedidas ou receberam diárias para a estadia?
Graciele – Recebemos diárias fornecidas pelo Ministério da Saúde.
Sindes – O que cabia às profissionais do serviço social?
Graciele – O Serviço Social era o único setor que ainda não tinha fluxo de trabalho. A Força Nacional ainda não tinha conseguido mapear qual era a demanda do trabalho, foi preciso fazer isso.
Tem duas profissionais da Casai que acompanham e dão suporte para os pacientes internados. Então o trabalho identificado como necessário era dar apoio aos acompanhantes dos pacientes que estão internados. Então cadastramos os acompanhantes que ficam no hospital, organizamos os voos de retorno para o território e a logística de controle para as famílias esperarem.
Além disso é preciso orientar os pacientes e acompanhantes a seguir os procedimentos médicos. Os indígenas são muito desconfiados com o tratamento e a intenção de mantê-los num local sem mobilidade, justamente pelo tratamento recebido em unidades não especializadas. Os Yanomami têm confiança no setor de serviço social.
As questões burocráticas também demandam muito do setor. A liberação do paciente ou do corpo, em caso de óbito, a certidão de óbito, a documentação o voo de volta… Tem muitos passos que são auxiliados pela assistência social.
Sindes – A missão está atendendo outros povos além dos Yanomami?
Graciele – Os Yanomami são na verdade vários povos, existem características comuns, mas eles nem se denominam Yanomami. O contato com eles foi há apenas 40 anos.
Sindes – A situação foi resolvida? A ameaça acabou?
Graciele – Nesse momento que a força está ali, as pessoas estão sendo atendidas, existe mais segurança para as comunidades indígenas. A Força está ali porque a situação não estava boa, houve mortes por desnutrição, mas mortes por violência também. Faltou cuidado e a Força está ali para dar condições para os profissionais locais seguirem o trabalho. A missão ameniza a situação, mas é preciso manter a atenção, impedir a invasão do território e garantir que eles possam viver como sempre viveram, são felizes assim.
Sindes – O que fica de bom dessa missão?
Graciele – Saber que as crianças e idosos que chegaram em situação de desnutrição estão ganhando peso. A alimentação emergencial está chegando.
As informações de que garimpos estão sendo retirados do território dão força para quem trabalha no apoio a essas populações. A constituição de um Ministério Indígena demonstra uma nova postura, uma movimentação pra minimizar a exploração predatória.
A repercussão internacional dessa tragédia faz o governo do Brasil precisar mostrar o compromisso de proteção dos povos indígenas. O ponto mais positivo foi conviver com eles, gente amistosa, carinhosa que faz a gente sentir satisfação em realizar o trabalho. Eles vivem causando pouco impacto na natureza, são protetores verdadeiros da floresta.
Atualmente, mais de 30,4 mil habitantes vivem no território indígena Yanomami. A situação na maior reserva indígena do país é dramática e foi considerada Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional pela ministra da Saúde Nísia Trindade. Equipes do Ministério da Saúde foram deslocadas para a região e se depararam com crianças e idosos em estado grave de saúde, com desnutrição acentuada, além de muitos casos de malária, Infecção Respiratória Aguda (IRA) e outros agravos.